Parlamento francês reconhece genocídio ucraniano pelo regime de Estaline

A Assembleia Nacional (Parlamento) francesa reconheceu esta terça-feira o “Holodomor” como o extermínio e genocídio ucraniano de milhões de pessoas durante a década de 1930, pelo regime soviético de Joseph Estaline.
Numa resolução aprovada quase por unanimidade, por 168 votos contra 2, os deputados exortaram o Governo a fazer o mesmo, para responder às fortes expectativas de Kiev sobre esta memória dolorosa, revivida pela invasão russa do país, noticiou a agência France-Presse (AFP).

O “Holodomor” [extermínio pela fome], “é a história da barbárie organizada” e “do uso da fome como arma política”, defendeu a sua primeira signatária, Anne Genetet.

Esta deputada concluiu o seu discurso com um “Vive l’Ukraine libre” [Viva a Ucrânia livre, em português], numa sessão que contou com a presença do embaixador ucraniano em França.

O texto foi co-assinado por membros de sete dos dez grupos políticos da Assembleia, com exceção dos grupos La France insoumise (LFI, extrema-esquerda), Comunista e União Nacional (RN, extrema-direita).

Os deputados do LFI não participaram na votação, referindo que há dúvidas sobre a natureza genocida destes eventos sob o direito internacional.

“Ninguém pode negar a realidade do crime”, mas “era uma questão de exterminar o povo ucraniano como tal?”, questionou Bastien Lachaud, deputado do LFI.

Os comunistas foram os únicos que votaram contra, considerando que os deputados não tinham legitimidade para se substituírem a historiadores e juízes.

“Recusamos contribuir para a politização das questões da memória e da história”, realçou o deputado Jean-Paul Lecoq.

O texto adotado “reconhece oficialmente o caráter genocida da fome forçada e planeada pelas autoridades soviéticas contra a população ucraniana em 1932 e 1933”.

E “condena” esses atos e “afirma seu apoio ao povo ucraniano na sua aspiração de ter os crimes em massa cometidos contra eles pelo regime soviético reconhecidos”.

A Assembleia Nacional instou também o Governo a agir sobre esta qualificação de genocídio e pede-lhe que “incentive no cenário internacional o livre acesso aos arquivos relativos ao “Holodomor”, mais particularmente na Federação Russa” para documentar os factos.

O ministro delegado para o Comércio Externo, Olivier Becht, destacou aos deputados a “óbvia ressonância com a atualidade” da sua resolução.

Becht apoiou a decisão mesmo que “não seja hábito do Governo reconhecer como genocídio atos que não tenham sido previamente qualificados como tal por um tribunal”.

O ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmytro Kuleba, agradeceu esta terça-feira ao Parlamento francês por reconhecer o “Holodomor” como “um genocídio de ucranianos e por honrar a memória das vítimas de Estaline e do seu regime”.

“Com esta votação histórica, a Assembleia Nacional deixou claro que tais crimes nunca serão esquecidos e nunca devem ser repetidos”, acrescentou, numa nota divulgada na rede social Twitter.

Apelidada como “o celeiro da Europa” pela fertilidade dos seus solos negros, a Ucrânia perdeu vários milhões de habitantes na grande fome de 1932-1933, num cenário de coletivização de terras, orquestrada, segundo historiadores, por Estaline para reprimir qualquer desejo de independência neste país, então uma república soviética.

Em meados de dezembro, o Parlamento Europeu também qualificou o “Holodomor” como genocídio.

Vários parlamentos de países europeus reconheceram o “Holodomor” como genocídio, incluindo os países bálticos, a Polónia, a República Checa e Portugal.

Alguns outros países, como a Argentina, Chile e Espanha, condenaram-no como “um ato de extermínio”.

A Rússia nega categoricamente esta classificação, referindo que a grande fome da década de 1930 não fez vítimas apenas ucranianas, mas também russas ou cazaques, entre outros povos.